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26 de Abril de 2024

Investigação Criminal e PEC 37: O que uma coisa tem a ver com a outra? O que isso tem a ver comigo?

Artigo de autoria da Procuradora de Justiça Dra. Ana Christina Souza Brandi Coordenadora Geral do Ministério Público

"Nas escolas, nas ruas, campos, construções

Somos todos soldados, armados ou não

Caminhando e cantando e seguindo a canção

Somos todos iguais, braços dados ou não

Vem, vamos embora, que esperar não é saber

Quem sabe faz a hora, não espera acontecer".

(Pra não dizer que não falei de flores, Geraldo Vandré).

De início, importa saber do que trata a Proposta de Emenda Constitucional n. 37/11. A denominada PEC 37, em tramitação no Congresso Nacional, visa acrescentar um parágrafo ao art. 144 da CF/88, no qual se pretende fazer constar que a apuração das infrações penais seja de atribuição privativa das polícias Civil e Federal.

Observa-se, pois, que a inclusão do advérbio "privativamente", almejado pela PEC 37 é uma palavra que modifica a atual sistemática constitucional e legal destinada à investigação criminal. Isso porque denotará atribuição investigativa exclusiva, de um único sujeito, a polícia, e, consectariamente, retirará de outros órgãos, a exemplo do Ministério Público (MP), o poder-dever investigatório que lhe é hodiernamente garantido.

Diante desse panorama, a possibilidade de investigação criminal direta pelo Parquet (e por outros órgãos estatais, a exemplo das CPIs, polícias internas da Câmara dos deputados e do Senado federal etc.) encontra-se ameaçada pela PEC377.

No caso específico do MP, malgrado não se encontre dispositivo constitucional que de maneira explícita confira a atribuição (alguns preferem o termo competência) investigativa na esfera criminal ao Parquet , tal função emana, lógica e sistematicamente, do Texto Magno e de diplomas infraconstitucionais.

Nesse diapasão, o MP foi erigido, pela Constituição Federal, a instituição essen-cial à função jurisdicional do Estado e responsável pela defesa da ordem jurídica, dos interesses indisponíveis (art. 127, caput, CF/88), exercendo o controle externo da atividade policial (art. 129, VII, CF/88; arts. , e 10, LC n. 75/93; art. 4º, § 1º, LC Estadual n. 02/90), que pode e deve requisitar diligências investigatórias (art. 129, VIII, CF/88; art. 16, CPP; art. 26, IV Lei n. 8.625/93; art. 7º, II, LC n. 75/93) por ser o destinatário dessa mesma investigação na condição de dominus littis da ação penal pública (art. 129, I, CF/88).

Não há, portanto, que se falar em privatividade da atuação investigatória da polícia judiciária. Essa conclusão é corroborada por doutrinadores do mais alto gabarito. Marcos Kac salienta que o inquérito policial demonstra que, ao contrário dos já aclamados princípios do Promotor Natural e do Juiz Natural, não há no procedimento administrativo o princípio da Autoridade policial Natural,

Não só os Membros do Ministério Público, como também o cidadão e a socieda-de não podem compactuar com tal medida! Ora, como aceitar se pode aceitar seja no âmbito da razão individual, seja quando considerada a opinião pública que o menos é mais? Ou seja, que a investigação de crimes promovida apenas pela polícia é melhor que essa mesma investigação realizada conjuntamente entre a polícia e o MP (ou qualquer outro órgão público que queira contribuir com a verdade dos fatos)?

Abstraindo-se o nítido viés corporativista da PEC/37, tem-se notório que a polícia não possui condições físicas e humanas para investigar com exclusividade, na medida em que é explícita a situação de salários defasados e muito aquém da honrosa e perigosa atividade policial, efetivo reduzido, departamento pericial precário, falta de informatização e armamento de ponta, limitação de munição, de coletes, de viaturas (não raro sucateadas e sem combustível). Esse triste quadro poderá ser ainda agravado com a aprovação da PEC 37, que, em vez de fortalecer a polícia, poderá sobrecarregá-la, e, o que se revela ainda pior, majorar a cifra da impunidade, já alta também em decorrência das dificuldades mencionadas, com o aumento dos crimes sem elucidação.

É importante frisar que a possibilidade de investigação pelo MP em nada suprime ou restringe a função investigatória da atividade policial. De equânime modo, não concentra a investigação no agente ministerial. Há, sim, uma atuação colaborativa, em conjunto, com o escopo comum às duas insignes Instituições: garantir a segurança pública e zelar pela concretização do justo.

Como obtempera Marcela Gama de Souza, em recente estudo sobre o tema, não se trata de centralizar o poder investigatório só na Polícia, pois a atuação conjunta desta corporação com o Ministério Público pode contribuir, e muito, na investigação e a elucidação de crimes, afastando, ou ao menos tentando reduzir, o sentimento de impunidade incutido na sociedade brasileira.

Nessa mesma linha, penso que a direção correta é aquela que se trilha junto, superando as "pedras do caminho" e aproveitando o que cada um tem de melhor, com o propósito de realizar os sonhos comuns.

Podemos, enfim, responder que a questão da investigação criminal está intimamente relacionada à matéria objeto da PEC 37, que, se aprovada, poderá significar uma relação conflituosa entre instituições que deveriam caminhar juntas na busca pela redução da criminalidade e na luta pela punição dos criminosos. E a persecução criminal atrelada ao sancionamento penal dos responsáveis pelos delitos tem tudo a ver comigo, com você, com o Estado e com a sociedade.

Então vem, vamos embora! Esperar não é saber... façamos acontecer! Caminhando no sentido da efetiva colaboração entre MP e Polícia indicada e desejada pela Constituição Federal. E cantando a soma dos esforços dos agentes públicos, a independência harmoniosa e a união das Instituições. E seguindo a canção que ecoa da boca do povo brasileiro clamando incessantemente por Justiça!

1 KAC, Marcos. O Ministério Público na investigação penal preliminar. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 115-116.

2 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 10. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 65.

3 SOUZA, Marcela Gama de. O poder de investigação do Ministério Público na esfera criminal. In: BELÉM, Greyce Mendonça et. al. Instrumentos de atuação extrajudicial do Ministério Público. Porto Alegre: Verbo Jurídico, p. 99.

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